Movimentos denunciam golpes da bancada ruralista

Manifesto

 

Em manifesto divulgado nesta quarta-feira, 13, movimentos sociais denunciaram que membros da bancada ruralista no Congresso usam as estruturas do Estado e a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para "retirarem direitos inalienáveis"; "O governo interino e golpista de Michel Temer assevera este processo de opressão e conflito, quando modifica em seu governo, a condução política dos órgãos responsáveis pelas políticas territoriais entregando-os aos partidos políticos conservadores e com vínculos fáticos com o agronegócio e com a bancada ruralista", diz o texto, assinado por entidades como MST, Contag e Fetraf; leia íntegra

13 DE JULHO DE 2016 ÀS 17:58 // Fonte: site 247

 

 

247 - Em manifesto divulgado nesta quarta-feira, 13, movimentos sociais denunciaram "ataques orquestrados da bancada ruralista no Congresso" aos direitos dos conquistados pelos movimentos.

 

"Membros desse parlamento brasileiro que usam indevidamente as estruturas do Estado e o instrumento da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para obterem benefícios próprios e retirarem direitos inalienáveis a nós assegurados", diz o texto, assinado por entidades como Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), Coordenação Nacional Quilombola (CONAQ), Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (FETRAF) e Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

 

"O governo interino e golpista de Michel Temer assevera este processo de opressão e conflito, quando modifica em seu governo, a condução política dos órgãos responsáveis pelas políticas territoriais entregando-os aos partidos políticos conservadores e com vínculos fáticos com o agronegócio e com a bancada ruralista", diz o texto.

 

Leia a carta na íntegra.

 

"Carta dos Movimentos Sociais do Campo

contra os golpes da bancada ruralista no Congresso Nacional

 

Nós, as organizações e movimentos sociais abaixo-assinados, que integram a articulação unitária dos povos do campo, da floresta e das águas, perante os ataques orquestrados bancada ruralista no Congresso Nacional contra os nossos direitos, estamos por meio desta carta, denunciando os membros desse parlamento brasileiro que usam indevidamente as estruturas do Estado e o instrumento da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para obterem benefícios próprios e retirarem direitos inalienáveis a nós assegurados.

 

Em outubro de 2015, por iniciativa de parlamentares vinculados aos interesses do agronegócio, foi criada uma Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI, para supostamente investigar a atuação da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) a respeito da demarcação das terras indígenas e da titulação dos territórios dos remanescentes de quilombos, entre tantas outras questões de fato.

 

Esta denúncia se embasa no fato de que a criação e o funcionamento desta CPI negam todo e qualquer princípio constitucional, legal, jurídico e normativo, não se amparando em fatos determinados e nem em justificativas de fundamento. Com uma participação majoritária, os membros da bancada ruralista, utilizam-se de inúmeros expedientes para aprovarem ou rejeitarem apenas as matérias que atendem aos seus próprios interesses e constroem situações que extrapolam, em muito, um papel regular que deveria ter uma CPI. Os parlamentares concentram os principais esforços da CPI para tentar desmoralizar e criminalizar membros dos movimentos sociais, estudiosos, trabalhadores rurais, indígenas e quilombolas que lutam pelo direito a terra e ao território. Da mesma forma, atacam instrumentos, políticas e as instituições públicas que têm por finalidade jurídica atendar a estes povos.

 

A realidade de desmando e autoritarismo que ora denunciamos e que é vivenciada nesta CPI, demonstra que a democracia representativa no Brasil ainda precisa avoluir para se consolidar. E para que isto ocorra, é fundamental a realização de uma ampla reforma do sistema político e, também, de políticas estruturais que alterem a brutal concentração da propriedade da terra e do poder, indo além do que foi possível com a retomada do processo democrático no Brasil, pós golpe militar realizado em 1964 e que perdurou até 1985. Aparentemente, nossa democracia seguia um curso de consolidação em nosso país, com os percalços evidentes de sua jovialidade e de um sistema político baseado na força do poder econômico.

 

Com a Constituição Federal de 1988 e a inclusão na Carta Magna de preceitos fundamentais da participação popular, da busca pelo estado de bem-estar e justiça social e da afirmativa de garantias fundamentais às minorias, afirma-se o Brasil como um Estado democrático de direito, apoiado em fundamentos, tais como a dignidade da pessoa humana (art.1º), em objetivos como a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, erradicando a fome e combatendo o preconceito (art. 3º) e dando a todos os cidadãos, a igualdade perante a lei (art.5º).

 

No meio rural, mesmo não havendo um processo de ampliação da reforma agrária e da regularização fundiária de áreas ocupadas por povos e comunidades tradicionais, foi possível nos anos recentes, algumas melhorias significativas na qualidade de vida do povo, deflagrado, conjuntamente com políticas de estruturação econômica, de financiamento rural, de participação social, afirmativo na busca da igualdade de raça, etnia, geração e de gênero.

Mas o sistema político não foi alterado e a concentração da riqueza e do poder não foi enfrentado a contento. No meio rural, continua o Brasil a ter uma das estruturas fundiárias mais concentradas do mundo, com forte correlação entre o latifúndio e o poder econômico e político, onde impera a violência e o conflito fundiário como forma de intimidação social e de classe. Ainda não nos livramos da existência do trabalho escravo, há grupos e milícias armadas bancadas pelos setores conservadores do meio rural que promovem o terror e a morte, consumimos mais agrotóxicos que qualquer outro país e caminhamos para ser os primeiros em produção transgênica de grãos.

 

O processo de demarcação de áreas indígenas e quilombolas conduzido pelo Governo Federal, nos anos recentes, só ocorreu por conta de muita mobilização social, pois seguiam em ritmo de paralisia. Os orçamentos destinados para a FUNAI e para o INCRA sofreram fortes ajustes, reduzindo drasticamente a capacidade de ação. Na reforma agrária, o mesmo processo estava em curso, redução no número de famílias assentadas e a invisibilidade do tema agrário na agenda do Governo Federal.

 

Há uma casta ruralista que exerce seu poder por diferentes matizes. Com a bancada ruralista no Congresso Nacional, com mais de 200 representantes, exercem o poder político. Com as vinculações ao empresariado conservador, reforçam os preceitos do capitalismo, pela exploração da mão de obra e dos recursos naturais na sua exaustão. E com forte vinculação econômica com as multinacionais do agronegócio, estabelecem a promiscua relação patrimonialista sobre o Estado.

 

Esta casta atuou fortemente no processo golpista em curso no Brasil, que afasta momentaneamente, a Presidenta Dilma do cargo de Presidenta da República.

 

Seguindo propósitos semelhantes e complementares, a bancada ruralista se mobilizou para criar a Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a investigar a atuação da FUNAI e INCRA na demarcação de terras indígenas e de remanescentes de quilombos (CPI FUNAI/INCRA), atropelando a Constituição Federal e inobservando a exigência do fato determinado, utilizando a CPI como instrumento de luta política para acirrar os conflitos no campo.

 

A Constituição Federal assegurou aos povos indígenas o direito originário e o uso exclusivo de suas terras tradicionais, às suas crenças, tradições e língua; às comunidades quilombolas, a preservação da cultura afro-brasileira e o reconhecimento de serem parte do patrimônio cultural brasileiro; e a destinação para a reforma agrária dos imóveis rurais que não cumprem sua função social.

 

Mesmo com estes direitos assegurados, os territórios ocupados pelos povos e comunidades tradicionais seguem sendo violados, invadidos e apropriados pelo agronegócio, pelos madeireiros e garimpeiros, que usurpam os recursos naturais e utilizam da violência costumeira para exercer o domínio da terra.

 

São estes os direitos que estão sendo ameaçados e que a bancada ruralista procura enfrentar por meio desta CPI. Além dos povos e comunidades tradicionais, a CPI procura constranger os servidores públicos do INCRA e da FUNAI e destruir suas competências.

 

O governo interino e golpista de Michel Temer assevera este processo de opressão e conflito, quando modifica em seu governo, a condução política dos órgãos responsáveis pelas políticas territoriais entregando-os aos partidos políticos conservadores e com vínculos fáticos com o agronegócio e com a bancada ruralista.

 

Por toda esta situação aqui exposta, é que os movimentos sociais rurais, que representam os assentados pela reforma agrária, os povos e as comunidades tradicionais, decidiram denunciar nacional e internacionalmente, os interesses dos ruralistas na condução desta CPI, usando as estruturas do Estado, para retirar direitos sagrados.

 

Esperamos contar com a solidariedade de todas as organizações sociais e dos mais diferentes setores da sociedade que também lutam por direitos e justiça, para que possamos construir uma forte rede nacional e internacional de apoio à causa dos povos indígenas, povos e comunidades tradicionais do Brasil, pressionando as instituições para que façam prevalecer seus direitos a suas terras e territórios.

 

PELO RESTABELECIMENTO DA ORDEM INSTITUCIONAL

PELA DEFESA DA DEMOCRACIA

FORA TEMER

 

Brasília, 13 de julho de 2016"

 

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB)

Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG)

Coordenação Nacional Quilombola (CONAQ)

Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (FETRAF)

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)

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