SUNDERHUS; Adolfo Brás
O Brasil inegavelmente tem na agricultura uma grande capacidade produtiva capaz de gerar trabalho e renda a custos bem inferiores aqueles ao do movimentado mundo do trabalho nas grandes cidades.
Apesar desta realidade, até o início do século XXI, nenhuma política pública estruturante se estabelece em forma de apoio e sustentabilidade aos agricultores familiares e camponeses seja de âmbito nacional, estadual e local. Resultado desta falta de visão estabelece-se um forte quadro de miséria no campo e falta de alimento para milhões de famílias nas cidades, em virtude de que na visão do Estado na final da década de 80 e por boa parte da década de 90 era de que a agricultura familiar não era produtiva e desta forma não fazia sentido algum estabelecer e fortalecer políticas de apoio ao seu desenvolvimento, definindo a opção política à agricultura empresarial e lavouras para produção de comodites atendendo ao mercado exportador em detrimento a produção de alimentos ao abastecimento interno.
Durante toda sua existência o MDA consolida-se como uma importante referência no Brasil e no mundo, pela capacidade de construir de forma dialogada com os protagonistas da agricultura familiar e suas representações, políticas públicas voltadas para este setor que imprimiu importantes conquistas como a Lei do PAA, a Lei do PNAE a desburocratização do PRONAF estabelecendo a visão da diversidade e da pluralidade do ambiente onde se estabelece a agricultura familiar em especial as questões de gênero e geração.
Constitui ainda uma importante ferramenta social produtiva e ambiental para fortalecer os processos de comercialização através do SIPAF selo “Aqui tem Agricultura Familiar” da mesa forma com forte reconhecimento no mercado nacional consolidando-se a abertura de mercados internacionais para as cooperativas da agricultura familiar que se organizam através da UNICAFES, estabelecendo-se assim o incentivo e o apoio público estatal oficial a processos de fortalecimento à organização em associações e cooperativas.
Outra importante conquista, mesmo que ainda em pequena escala e com visibilidade da “boca torta”, a agricultura familiar encontra pela primeira vez a sua inserção em linhas de pesquisa da EMBRAP. Outro marco fundamental está na aprovação da Lei de Assistência Técnica e Extensão Rural – ATER. Impactando positivo a partir desta visão pública esta na criação de políticas mundiais de combate a pobreza e a fome por meio de programas e projetos que apoiam diretamente e exclusivamente a agricultura familiar e camponesa, ou seja, aos historicamente desconhecidos e desassistidos pelo Estado.
Diante de todos estes dados descritos, em uma rápida análise histórica, estabelecer o fim do MDA e uma ação política equivocada, lamentável e que vai ao contrário de tudo a que se propõe as políticas públicas de Estado. Uma perda lamentável tanto para agricultura familiar e camponesa, para o respeito a gestão pública estatal e também para as cidades.
Esta atitude beira o desrespeito aos agricultores familiares e a sua luta e de suas famílias. Ao ser relegado a um status de secretaria especial da casa civil o impacto é aquele de que as reivindicações serão repassadas a um ministro que, de acordo com sua vontade política e de suas relações sociais e econômicas, certamente estabelecera um determinado filtro do que acreditar (de acordo com estas relações) ser o mais urgente entre as suas diversas funções. Perde-se a exclusividade de olhar a agricultura familiar dentro de seu víeis e de sua realidade. Corre-se o risco, e certamente este e o pensamento vigente, que agricultura eficiente e aquela que produz e gera lucro, ou seja, voltamos a passos largos a lógica dominadora e garimpeira da agricultura da revolução verde que deixou para o país um forte custo para saúde pública e um enorme passivo ambiental pelo uso de venenos e outros agressivos químicos.
Esta ação equivocada leva a um forte retrocesso ao acreditar que o apoio à agricultura familiar não é uma política de desenvolvimento e sim uma política social, visão esta em total desarmonia com o mundo inteiro que assume os Novos Caminhos do Milênio definindo a Fome Zero e a Agricultura Sustentável como um dos principais pilares para se alcançar o Desenvolvimento Sustentável. Perdem-se ainda todos os avanços que tinham como visão o entendimento de que as políticas públicas para agricultura familiar e camponesa não eram um conjunto de benefícios, mas sim um direito estabelecido em leis que garante esta continuidade e sua importância.
Fica o sentimento claro para todos que refletimos, pensamos e acreditamos que uma nova agricultura e possível, que esta proposta estabelece-se em um momento político que tem muito da “velha política dos coronéis” quer seja aquela de se deslocar, se afastar das políticas criadas por um governo que “não o seu”. Equivocada, pois estas conquistas se estabeleceram a partir do pensar e do agir das famílias dos agricultores familiares e camponeses e de suas representações, acabando com programas que tem eficiência e eficácia comprovada, comprometendo sua própria condição de gestor público que deveria se apoiar e buscar o desenvolvimento das pessoas, das famílias e da agricultura familiar e camponesa a partir de tudo o que está construído.
Não podemos admiti que um governante se renda a vaidades e aos interesses daqueles que pensam somente no lucro e no capital. Este governo certamente não terá o devido respeito.
E necessário se estabelecer respeitando a política pública construída a partir de um pacto sociedade e Estado em constante mutação e redirecionamento a partir de um rico processo de aprendizado e da logica do entendimento e da aceitação das divergências e dos contraditórios.